Muitos ainda guardam no imaginário que a entrevista de auditoria é um momento de inquisição ou inquérito. Errado!

O bom auditor coleta o máximo de informações possível, de maneira ética e confiável

Foi-se o tempo em que o auditor era o único dono da verdade e que chegava dando murros na mesa, causando pânico em todos. Na verdade, se você adotar esta postura, causará medo nas pessoas, que se fecharão, e, como reação natural, retrocederão e o fluxo de informações ficará mais difícil. Ou seja: você gastará mais energia e tempo para obter a mesma informação.

Péssimo negócio, não? Perceba: o bom auditor é aquele que, de maneira profissional, consegue gerar um clima amistoso, respeitoso, mas deixando o auditado seguro e à vontade, para que possa coletar o máximo de informações possível, de maneira ética e confiável.

Técnicas para a entrevista de auditoria

Há várias técnicas para facilitar a busca da informação e vários erros que podem ser cometidos. Obviamente, cada situação real exigirá uma resposta diferente e qualquer lista nunca será exaustiva. Portanto, vamos listar aqui alguns exemplos:

  • Prepare-se para a entrevista:

Tenha sempre em mãos antes da entrevista a lista de verificação e o meio no qual fará suas anotações. Cada auditor tem seu “estilo”: alguns levam um caderno, alguns usam tablet ou celular, outros utilizam notebook, muitos usam prancheta com folhas. Enfim, ache o meio que o deixa mais confortável.

O importante é que durante a entrevista você seja capaz de fazer anotações rápidas e precisas (e que seja capaz de entendê-las depois para fazer o relatório de auditoria).

  • Ser gentil e educado não faz de você menos profissional. Pelo contrário:

Tratar as pessoas com respeito e empatia, de forma polida, respeitosa e ética, é o que se espera de um profissional. Um auditor experiente sabe imprimir um clima cordial, ameno e profissional em uma auditoria, independente das não conformidades a serem constatadas.

Eu já fiz auditorias em que constatei mais de vinte não conformidades e terminei com agradecimentos e elogios por escrito para a minha chefia agradecendo o meu trabalho. Tudo depende da postura e do respeito.

  • Informe ao auditado que você fará notas durante a entrevista:

Sim, pode parecer trivial para você, mas, para o auditado, o simples fato de você fazer uma pergunta, ele responder, e em seguida você começar a anotar, pode parecer a ele que há algo errado – “por que eu falei e ele já está anotando? Será que falei alguma não conformidade?” – e ficar nervoso com isso.

Portanto, a recomendação é que, antes de iniciar a entrevista, informe ao auditado que durante a entrevista você precisará fazer anotações, que isto é parte normal do processo de entrevista, até porque precisa coletar evidências da conformidade. Com certeza, este pequeno gesto já gerará uma maior tranquilidade.

Então, de maneira natural, inicie a entrevista com assuntos amenos, como por exemplo o nome e função (aproveite para confirmar se está entrevistando a pessoa certa) e como é o dia-a-dia da pessoa. Assim o entrevistado começa a falar sobre algo que é de seu domínio – sua rotina – e vai se acostumando com sua presença.

Aproveite então para pegar um “gancho” – um detalhe de sua rotina para, naturalmente, introduzir as perguntas da auditoria. Será bem mais suave e natural.

  • Não tenha medo de dizer que você não entendeu.

Pode acontecer de durante a entrevista por algum motivo você não entender parte da explicação do auditado. E o pior a ser feito é fingir que entendeu e ir em frente. Porque se o auditado perceber isto, ele pode então começar a perder a consideração técnica por você.

Então o correto é: não entendeu algo? Pare imediatamente e peça que o auditado explique novamente.

  • Técnica dos cinco segundos:

Esta é uma técnica que deve ser utilizada de forma muito discreta, com parcimônia e de forma bem sutil, em situações bem direcionadas.

Explicando: em certos casos, você tem quase certeza de que fez uma pergunta e que o auditado respondeu pela metade, ou seja, não falou tudo o que deveria. Neste caso, uma boa ferramenta a ser aplicada é, ao final da fala do auditado, ficar mudo e olhando para o auditado, sem ter nenhuma expressão facial, pacientemente contando pausadamente (mentalmente) até cinco.

Acredite, se a pessoa de fato está omitindo uma informação, estes serão os cinco segundos mais longos da sua vida. E a tendência é que ela se questione por que você ainda está lá olhando para ela como se esperasse que ela continuasse a falar. E em boa parte das vezes ela complementa a sua fala!

  • Uma pergunta por assunto, um assunto de cada vez:

Não faça duas ou três perguntas em uma. Este é melhor o caminho para o auditado, se ele quiser, causar confusão na resposta, dar uma grande volta em uma das respostas e fazê-lo se perder e esquecer das outras perguntas (principalmente se ele sabe que tem problemas nas outras perguntas).

Funciona assim: ele escolhe das perguntas uma que ele sabe que tem boas respostas, alonga-se nela, gasta um bom tempo, e você acaba se perdendo, esquecendo das outras perguntas. Acredite, é muito comum de acontecer.

  • Linguagem “bovina” – é o famoso “hum, hum”.

Na verdade, pode ser “sim”, “entendo”. São formas de você sinalizar ao auditado que está acompanhando seu raciocínio, de demonstrar que está interessado na sua fala, que valoriza o que ele está dizendo, o que o estimula a continuar falando.

  • Comunicação não verbal:

Sem entrar em polêmicas de estudos e números exatos (por exemplo, a antiga regra dos 7%-38%-55% de Albert Mehrabian, que está constantemente sob forte contestação na comunidade cientifica) o fato é que é razoável afirmar com base em vários estudos que, quando duas pessoas conversam, aproximadamente 50% da comunicação é não verbal.

Ou seja, não é o que se diz, e sim a forma como se diz, o tom de voz, a pausa, a respiração, a expressão facial, corporal, o gesto, etc. Por isso atualmente há tanto desentendimento em grupos de amigos e familiares de WhatsApp: a comunicação simplesmente escrita é por demais incompleta e gera muitas interpretações diferentes das que intencionava o emissor da mensagem.

Portanto, caro auditor, se você quer aperfeiçoar suas técnicas de entrevista, é inevitável que comece a estudar esta comunicação não verbal: linguagem corporal, microexpressões faciais, dentre outras.

  • Evite interferências de pessoas estranhas durante a entrevista:

Não permita que outras pessoas ajudem o entrevistado: veja, em auditoria não existe a “ajuda dos universitários”. Se você selecionou por amostragem o operador do equipamento EPQ 010 para entrevistar e confirmar se ele sabe como operar o equipamento e o procedimento para tal, é este operador quem tem que responder.

É natural que um colega, ou até o supervisor dele ou o guia da auditoria, ao perceberem alguma dificuldade, queiram ajudar, mas o auditor não pode permitir, pois deste modo entrevista perderia o sentido (seria como “contaminar a amostra”).

  • Selecione o nível de supervisão durante a entrevista:

Muitas vezes ao iniciar a entrevista aproxima-se o chefe do entrevistado e este fica constrangido ou com medo de falar algo errado na frente do chefe. Naturalmente, e já tratamos disto, pessoas com medo se fecham e falam menos, o que não queremos em uma entrevista de auditoria.

Então, se você perceber que há alguém causando este constrangimento, discretamente e de maneira diplomática você terá que negociar a retirada daquela pessoa das entrevistas.

  • Escolha suas próprias amostras! Sim, não permita que o auditado tome a decisão de amostragem:

Esta é uma tarefa do auditor. A amostragem no mínimo deve ser aleatória, e de preferência estratificada. Ao permitir ao auditado selecionar a amostra, se o mesmo tiver algum problema, ele pode direcionar a amostra para elementos da população-alvo que sabidamente não tem problema, contaminando a amostra.

  • Ajuste a linguagem da entrevista ao entrevistado:

Embora a questão da lista de verificação seja a mesma, o auditor tem que ajustar a linguagem e as palavras utilizadas de acordo com a escolaridade e nível sociocultural do entrevistado. Naturalmente, não se utiliza a mesma formatação de pergunta para um membro do conselho de acionistas e para uma pessoa do chão de fábrica.

  • Evite distrações, mantenha-se focado:

Desligue o celular ou mantenha no modo silencioso. Durante a entrevista, dedique total atenção ao que o auditado está falando. Não desvie o olhar. Nada mais desencorajador e antiprofissional do que iniciar uma entrevista e no meio da mesma começar a olhar as horas, o celular, ou a desviar o olhar para outro lugar.

  • Seja transparente:

Nada de esconder informações do auditado. Pelo contrário! O certo é, ao terminar a entrevista, virar a tela do computador (ou mostrar o texto escrito no caderno) e mostrar. Diga a ele que como resultado da entrevista estas foram as anotações. Peça que ele leia e diga se você entendeu tudo corretamente. Seja transparente e valide suas anotações.

Por fim, sempre ele, o bom senso. Na dúvida, tenha empatia, coloque-se no lugar da outra pessoa. Antes de agir, antes de tomar uma atitude, pense como a outra pessoa perceberá sua ação.

Artigo originalmente publicado no Linkedin por Marcello Couto: “Técnicas de entrevista para auditores